O Bloco Cores de Aidê mais uma vez sacudiu as ruas de Florianópolis com seu desfile Malandragem: A Potência das Ruas no Carnaval de 2024. Mais de 200 pessoas, entre integrantes e convidadas, se uniram à festa na sexta-feira, 9 de fevereiro, dia do desfile dos Blocos Afros, em um espetáculo de alegria, diversidade e ancestralidade na Praça XV de Novembro, no centro histórico da capital catarinense.
“Todos os anos o Bloco Cores de Aidê se debruça no tema do Carnaval para levar às ruas um desfile totalmente novo e autêntico, esse ano não foi diferente”, diz Sarah Massignan, idealizadora e coordenadora geral do Bloco Cores de Aidê.
O desfile foi marcado por diversos momentos emocionantes. No início, mulheres do axé, integrantes e convidadas, ofereceram um Padê para Exu pedindo licença às forças das ruas e abertura dos caminhos para o desfile do Bloco. Outro momento impactante foi quando as alas do Bloco – Dança, Perna de Pau e Percussão – receberam as alas convidadas para integrarem o espetáculo em frente à Catedral Metropolitana.
“A ala da Perna de Pau, conduzida por Paula Batista, foi uma grande novidade deste ano, que levou o bloco a novas alturas”, destaca Sarah.
Homenagem e representatividade nas alas convidadas
A artista plástica Gugie Cavalcanti foi uma das convidadas especiais, grafitando ao vivo em uma plataforma sobre rodas, em forma de alegoria. A Ala da Capoeira homenageou Mestras e Mestres de Florianópolis com dezenas de capoeiristas e seus berimbaus. A personagem Malandra, representada por Ísis Michel, e o Malandro, representado por Leonardo Rodrigues, também marcaram presença.
Já a ala das Danças Urbanas, sob o comando de Júlia Milan, injetou ainda mais energia e improviso no cortejo. A coreógrafa e bailarina Andréia Zaida saiu como porta-estandarte do Bloco, enquanto Aldelice Braga, a Nêga, precursora do ensino de dança afro-brasileira na região, puxou a Ala da Pipoca.
O desfile também contou com a presença de pessoas com relevância pública, como representantes políticos e lideranças sociais: Carla Ayres, vereadora pelo PT; Ekena, artista e cantora; Ingrid Sataré Mawé, ativista socioambiental e feminista; Marquito, deputado estadual pelo Psol; Tânia Ramos, vereadora pelo Psol.
“Cada uma dessas pessoas tem uma trajetória na rua e na cidade que se conecta diretamente com o tema e faz com que a trama de Alegria Laroyê (música do Carnaval) seja ouvida, sentida e vista”, explica Sarah.
Alegria Laroyê, o som da malandragem
A energia do bloco foi embalada pela música “Alegria Laroyê”, composta por Bel Ignacio, Inara Moraes e Paula Santos especialmente para o Carnaval.
“‘Alegria Laroyê’ é uma composição muito feliz que tem como refrão um verso que cativa e contagia todes que ouvem. Essa música teve um arranjo muito bem elaborado pela regente geral da percussão Dandara Manoela, que trouxe ainda mais riqueza para o desfile”, explica Sarah.
A composição celebrou a malandragem, a brincadeira e a diversão, convocando Exús e Pombagiras para a festa. As sambistas Juliana D’Passos, Julia Maria e Julia Amorim foram responsáveis por puxar a música-tema.
“Todo o povo da rua nos acompanhou nessa música para mover e quebrar com as estruturas”, afirma Sarah.
Bloco traz acessibilidade ao Carnaval
O Bloco Cores de Aidê nasceu, em 2016, com o objetivo de ser um espaço de acolhimento, coletividade e partilha. O desfile junto aos Blocos Afros é uma verdadeira obra de arte composta por diversas linguagens, que celebra a diversidade em todos os sentidos.
Neste ano, o Bloco contou, pela primeira vez, com a participação de Ana Santiago, uma mulher cega. Diante disso, passou-se a pensar coletivamente em diversas ações de inclusão, como as adaptações das oficinas percussivas e o próprio desfile. Uma das iniciativas foi a audiodescrição das diferentes alas e do figurino antes do desfile. O estandarte confeccionado com o tema do carnaval também foi feito todo em alto relevo.
“Enquanto cidade, o Carnaval deixa a desejar em todos os aspectos, marginalizando a população de Pessoas com Deficiência com zero acessibilidade. Precisamos repensar, discutir e ouvir as pessoas com deficiência para que, juntos, possamos construir um caminho mais adequado e inclusivo”, diz Sarah.
Outras apresentações
O Cores de Aidê realizou outras duas apresentações no âmbito do Carnaval 2024. A segunda delas aconteceu no domingo, dia 11 de fevereiro, na Praça Bento Silvério, com o apoio da Escola de Samba União da Ilha da Magia.
Nesta ocasião, o espetáculo reuniu as alas fixas do Bloco com a presença de alguns convidados, que desfilaram em um cortejo ao redor da praça para a comunidade da Lagoa da Conceição.
O encerramento do Carnaval ficou por conta do tradicional cortejo especial para as crianças, que fez o trajeto entre o Mercado Público de Florianópolis e a Praça XV. Costumeiramente realizado na quarta-feira de cinzas, esse último desfile foi adiado devido ao mau tempo e aconteceu no sábado, dia 17 de fevereiro, pela manhã.
“A quarta-feira de cinzas foi escolhida para a realização deste desfile por ser um dia em que a realidade bate na vida das cidadãs e cidadãos. Às vezes, as cinzas tomam conta, e as crianças trazem esperança, cores e alegria para cada pessoa que assiste ao desfile”, explica Sarah.
Todos os anos, nesta apresentação, o Bloco conta com a participação dos projetos sociais É da Nossa Cor e Menina Percussão, que fazem parte da história do Cores de Aidê desde o início. O primeiro projeto era vizinho do Bloco nos ensaios no Morro da Caixa, e o segundo também é coordenado por Sarah Massignan.
“O Carnaval é um espaço para brincar, criar, acreditar e sonhar, um espaço ideal para as crianças. Não vemos hoje aqui um Carnaval de rua para as crianças. O intuito é justamente democratizar a brincadeira para elas”, comenta Sarah.
O Bloco Cores de Aidê é um exemplo de como o Carnaval pode ser um espaço de celebração da vida, da cultura e da diversidade. Através da alegria, da música e da ancestralidade, o bloco promove a inclusão e a representatividade, fortalecendo a comunidade e construindo um futuro mais justo e igualitário.
Carnaval 2024 foi garantido com recurso de editais
O Bloco Cores de Aidê foi financiado através de diferentes ações promovidas por integrantes, como a festa de escolha da música, brechós e rifas.
O Cores de Aidê também recebeu financiamento público para a edição 2024 através do edital Elisabete Anderle, de Incentivo à Cultura, categoria Artes Populares, realizado pela Fundação Catarinense de Cultura com recursos do Governo do Estado de Santa Catarina. O Bloco foi selecionado como uma proposta cultural com o propósito de valorizar e apoiar as práticas e os detentores das tradições, memórias, saberes e fazeres das culturas negras e afro-brasileiras desenvolvidas em Santa Catarina.
Fernanda Pessoa de Carvalho | Jornalista | Dançarina do Bloco Cores de Aidê